Pedrinha por Pedrinha


Era noite quando chegou aquele par de olhos calmos. 
Eles mais que me olhavam, me perscrutavam.

Eu, que não andava _atropelava_, me senti atraída por aquela maneira de ser olhada como uma minúcia da natureza. E aquele esboço de sorriso que quase se formava _mas apenas quase_, me deixava sem saber se era contemplada ou repreendida. 

Meu instinto dizia "se joga". Já aqueles olhos, bem, não sei o que aqueles olhos diziam _mas diziam.

Perdi o sono. 
Cultivei girassóis.
Velhas músicas passaram a ter novos sentidos, me entregaram sonhos, quereres e a sede de ser imiscuída naquele par de olhos calmos.

O instinto é forte, atendi. 
Entretanto, dei de cara com uma muralha. 
Aquele par de olhos calmos sabia muito bem como se resguardar.
Minha natureza exigiu-me os explosivos, mas o que recebi daqueles olhos perscrutadores foi tão somente um cinzel e um martelo.

"Sim, se queres meus olhos pousando sobre a tua vida, nada de explosivos. Ouça a chuva, ouça o mar e, serenamente, enfraqueça minha muralha. Pedrinha por pedrinha. Tens paciência? Qual será o tamanho do teu querer, olhos urgentes?"

Nunca imaginei que a calma me desafiaria, que minha natureza seria confrontada tão limpidamente. Mas como tenho um coração disposto a tudo que o emocione, cá estou, cantarolando velhas músicas, com o cinzel e o martelo nas mãos, retirando pedrinha por pedrinha dessa muralha que guarda aqueles olhos calmos que fazem dos meus, incandescentes.

De dia faz Sol, os girassóis vibram ao som do mar.
De noite chove, eles dançam para mim.
E a cada amanhecer a muralha fica menos fortalecida.

Aquele par de olhos calmos tem uma força indizível, capaz de mudar a minha natureza insana, num desafio de calma e conquista. 

Nada de explosivos.
Com serenidade, logo o alcanço.

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