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Eu sei que sou confusa e quando você me compreende, me confunde mais ainda. |
É que eu não sei como acontece.
Já te mandei embora um monte de
vezes. Na hora eu senti um alívio infinito, como se pudesse respirar livremente
outra vez. Não que você me prendesse, ao contrário, você sempre me deixou livre
para o que eu quisesse ser ou fazer, mas mesmo assim, te mandar embora me dava
sensação de liberdade.
Mas aí passavam poucas horas e eu
começava a me flagrar olhando para o celular, como quem espera por uma ligação.
Às vezes você ligou, às vezes, não. E quando ligou, te tratei com desdém, para
me defender. Mas confesso: eu estava com o coração acelerado, vigiando
aquela tela onde os minutos se trocavam e as horas também.
Já consegui ficar mais de dez
dias sem te ver, sem te atender, sem te sentir. Desde o primeiro dia em que ficamos
juntos, no entanto, estou sem compreender.
No início duvidei muitíssimo do
teu sentimento. Por muito tempo pensei que todos os sacrifícios que fazia eram
por você mesmo, pelo ego, como se ficar comigo tivesse se tornado uma questão
de honra. Sim, porque já te falei barbaridades, já disparei sobre você meus
olhares mais frios, e você? Manteve-se concentrado, à minha volta, esperando
pelo tempo certo de me agradar de novo.
Eu até cedi algumas vezes e
reatei por admitir minha saudade, mas na maioria, mesmo com saudade eu fiz
pouco caso e deixei claro que você era insistente demais, como se eu me
deixasse vencer pelo cansaço. Jamais! Voltei porque quis, porque senti saudade,
porque senti muito a tua falta.
E cada vez em que a gente reata,
eu percebo que a minha guarda fica um pouco mais baixa. A tua paciência comigo
tem me desarmado, muitas vezes, me desmontado. Fico perplexa com o teu
desprendimento, com tudo o que te vejo enfrentar para estar uns poucos minutos
a mais comigo. Eu já perdi a credibilidade com as pessoas de tanto que falei que nunca mais voltaria pra você.
Fico constrangida com o jeito que
você me olha, como se eu fosse a melhor ideia de Deus. Eu não sou.
Te falei dos meus segredos para
te assustar, mas você quem me assustou quando decidiu mergulhar nos meus
problemas, nas minhas crises e patologias. Eu sei que sou confusa, mas você
querer me compreender _e conseguir isso_ me confunde mais ainda.
Você diz que não entrou na minha
vida por acaso, que é meu anjo protetor.
Já ri disso.
Já cogitei isso.
Já acredito nisso.
Já ri disso.
Já cogitei isso.
Já acredito nisso.
Muita coisa em você me irrita e
essa lista de coisas me enlouquece. Você tem hábitos que precisam ser
corrigidos e às vezes tropeça no português, mas mesmo quando eu, furiosa te
critico, ou firmemente delicada te corrijo, você continua a me olhar como se eu
fosse a melhor ideia de Deus e esse é o teu maior argumento, que me desarma sem fazer força alguma. Daí eu me sinto uma monstra, mas
mesmo assim, não esboço culpa, embora eu sinta muita culpa.
Numa noite de segunda-feira, no
entanto, foi você quem me salvou dos meus remorsos, quando me socorreu no chão
do meu quarto escuro. Você me abraçou forte. Me salvou
de mim mesma. E reatamos, mais uma vez.
Sempre fui passional e não sei
lidar com esse sentimento calmo que tenho por você. Não trocamos mensagens
desesperadamente apaixonadas, não falamos em morte como o limite de uma
separação, mas mesmo sob olhos brilhantes do passado, eu jamais senti essa paz
que vem de você. Parece que estamos juntos há anos, mas ainda só tivemos um inverno.
Talvez a melhor ideia de Deus
tenha sido juntar nós dois.