De dia as
angústias da vida são menos aparentes
Com os
bem-te-vis animados,
motores dos carros roncando nas ruas,
Com a obra do
edifício ao lado
e os passos do vizinho do andar de cima.
Eu os ouço.
Sinto que faço
parte de tudo isso sem estar presente.
Nunca estou presente.
De olhos
fechados, vou ao lugar mais bonito.
Aumento meus barulhos interiores.
Agora sou uma menina,
no colo de meu pai, que me beija os cabelos.
Sinto cheiro do
assado de Natal,
ouço a canção que mamãe canta para me ninar.
Arrepio.
Numa lágrima,
a
realidade bruscamente desliga meus barulhos interiores,
arranca-me de meus
pais.
Adeus, meus
amores, adeus.
É hora de colocar a máscara e sair.
Ora vou.
Sorrindo.
Sofrendo.
Morrendo.
Sorrindo.
Vou.
De dia as
angústias da vida são menos aparentes
Com os
bem-te-vis animados,
motores dos carros roncando nas ruas,
Com a obra do
edifício ao lado
e os passos do vizinho do andar de cima.
Volto a ouvi-los.
Fecho a porta,
solto os cabelos,
agarro com todas as forças a máscara que me defende
e sorrio para o
vizinho do andar de cima, que encontro no elevador.
Já na rua, ouço os
bem-te-vis em festa,
o ronco dos motores dos carros parece mais alto
O edifício ao
lado está cada dia mais imponente
_meu mundo, cada dia mais solitário.
Sinto que faço
parte de tudo isso sem estar presente.
Nunca estou presente.
Mas eu suporto
um pouco mais disso, ainda é dia
e é de dia que
as angústias da vida são menos aparentes.