Um dia, que eu não sei qual é


O tempo magoa a pressa. Ele tem seu ritmo próprio, lento e contido. Mas o coração machucado tem urgência. Primeiro ele se agarra fortemente a tudo o que acabou, não admite a nova realidade. Depois, desolado, com um fio de raiva, ele quer arrancar de uma só vez as memórias afiadas, o cheiro insistente, a página de uma história que já não mais existe, mas ainda está presente. Contudo, o tempo ignora. E continua, a passos lentos, seguindo seu percurso de cicatrização e de sabedoria.

Então o peito queima, dói, às vezes sente-se explodir. Do lado de dentro a velocidade é da luz. Os pensamentos se chocam aos borbotões, as lembranças se misturam a projeções infundadas, mas o tempo passa a conta-gotas, silenciosamente, ignorando os barulhos interiores.

Chega a ser sádico, mas o tempo não se importa. Ele está fluindo sem parar e, por mais que não seja evidente, ele está ajeitando nossas confusões, diluindo memórias e curando nossos machucados.

O tempo magoa a pressa e por isso andamos tão magoados. Entretanto um dia, que eu não sei qual é, seremos borboletas. E reamaremos, com asas e corações tranquilos.

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