Como se fosse o Primeiro


Gosto de olhar para trás
e ver muito em tão pouco
Ver que tanto, de tão pouco,
sempre pôde me fazer tão feliz
E que sempre, sempre foi assim
Gosto de olhar pra trás
e ver minha vida simples
[porém não simplória]
de menina criativa,
que do pouco fazia um império
Não por ambição, mas por fantasia,
talvez por vestígios de poesia,
que já floresciam na minha simplicidade
de improvisação e de alegrias fáceis
Gosto de olhar pra trás
e ver quantos sonhos eu cultivei sem saber
Quanta simplicidade no olhar 
de quem só queria vencer em felicidades,
não em títulos, cifrões ou quilates
Gosto de olhar pra trás
e desacreditar dos absurdos que enfrentei
Das agonias em comparações desmedidas,
que não me levaram a nada,
a não ser à constatação de que destoo
[como sempre destoei]
Gosto de olhar pra trás
e ver que rios de dinheiro nunca me seduziram,
que ainda menina alcancei o prazer da Arte
e isso, não há moeda que cubra,
tão cedo soube!
Escrever, desde sempre, é meu vício e,
a paz desde aquele Março chuvoso e quente,
é a melhor parte, sem negociar
Gosto de olhar pra trás para compreender
minhas diferenças em mim mesma
Da menina que sonhou
com um amor bem conjugado,
em futuro mais-que-perfeito
_ainda que ele só exista no pretérito
Eu vivi dores inimagináveis
Eu estanquei sangue inocente
e isso às vezes faz
com que eu não goste de olhar para trás,
mas ainda assim eu olho
porque um lenço acolhe o passado
e meu presente é uma avenida 
cheia de precipícios que exigem coragem
e mais, muito mais, simplicidade de coração
Eu só quis um amor leve,
desses que, de tão descomplicados, são caros
Eu só quis uma paz anônima, singular
Eu só quis escrever sem rótulos,
sentir sem amarras, viver em levezas e,
ao olhar para trás,
agrada-me ver
que não fui corrompida pela amargura
tampouco pela sedução de fartura
É a simplicidade de ser que ainda busco
A felicidade de me isolar às vezes,
sem julgamento
e a musicalidade da vida,
que amo gozar em silêncio ou sorrindo,
em teu colo, cúmplice e parceiro,
mirando mais um ocaso como se fosse o primeiro
[e sempre é].

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