No limiar dos sentidos


Me vês inteira sempre que me olhas
Extrema, no limiar dos sentidos,
sem máscaras ou dissimulações
Se grito é porque dói
Se me calo é porque continua a doer
Mas silenciosamente prossigo
Vês esse mundo imenso que movimento?
Vês esse universo que mantenho criativo todos os dias?
Percebes essa vastidão de sentimentos calados
e de reações mudas, que dizem tanto?
É o teu mundo que faz o meu respirar
É o teu fôlego que alimenta minhas articulações,
que faz viver minhas entrelinhas,
que faz meu sangue correr e a minha respiração insistir,
ainda que automática, como agora
Vede, as pessoas cada dia mais me decepcionam,
me agridem com suas certezas,
me isolam de suas vidas como a um vírus da peste,
me traem sorrindo, como se não fosse nada
Eu não teria o menor receio de perguntar-lhes suas razões
Eu não sinto vergonha alguma de pedir perdão,
de me colocar à disposição do julgamento
para alcançar o entendimento
Entretanto às vezes me falta mesmo a vontade
Se não sinto meu silêncio respeitado
Se não vejo minha intuição confortável
Eu não sou obrigada a prosseguir
com energias que não me atraem,
mas não encontro seu direito de privar outros corações
a andarem com o meu
Todos podem me ver inteira sempre que me olham
Extrema, no limiar dos meus sentidos
E isso decerto é deveras agressor
Porque embora amem egos massageados,
ignoro
Nego tranquilamente um afago que me desrespeita
Essa força avassaladora
que me implode em mim mesma
chama-se poesia
Verdade absoluta que me exige verdadeira
Sensibilidade extremada que me mata
e me ressuscita todos os dias
E eu não teria receio algum em tentar te entender,
mas o meu pacto secreto com a poesia
faz-me deixar-te ir, sem explicações,
quase que sem pressão arterial
pois bem sei que minha sensibilidade, posto que frágil,
é muito mais violenta comigo mesma
E é nessa antítese que me equilibro
Se eu padeço em manter-me ereta sobre ela,
o que eu poderia exigir de ti,
pequenina alma?

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