Modus Operandi de Sentir



Adoraria saber onde fica o botão que dispara a razão e cancela a sensibilidade dentro de mim. As pessoas me dizem para "viver a minha vida", "dar tempo ao tempo" me ocupando da incrível pessoa que sou, como se fosse algo simples [e sensacional!] de fazer. E talvez seja mesmo. Talvez seja algo tão óbvio que eu, complexa que sou, não alcanço.

O fato é que cada um tem dentro de si o seu terreno especial, que deve estar sempre muito bem cuidado e viçoso. Para muitos, esse terreno é o conforto, a estabilidade material. Para muitos outros, é uma vida dedicada aos estudos. Outros tantos priorizam a realização profissional e o seu ótimo emprego. Azar o meu, que não ligo para nada disso. Eu preciso ter vibrante e bem cuidado o terreno do amor. Não há saldo bancário, emprego, curso, viagem ou qualquer outra coisa maravilhosa que me seja verdadeiramente decisiva.

Quando alguém me diz para viver a minha vida e não pensar tanto numa ausência, num silêncio, numa distância, é como ouvir: "está vendo esse piano de cauda, lindíssimo? Suas teclas são mudas, mas você pode tocá-lo à vontade! Não precisa ouvir o que está tocando, só precisa exercitar os dedos. Sente-se, olha como você fica linda diante dele! Sorria, menina!"

"Viva sua vida, olhe mais para você" também me soa como: "seja agradecida por essa mesa farta, cheia de comida maravilhosa. Não há uma gota ou um grão de tempero nela, mas você é abençoada por tê-la. Farte-se dessa comida sem gosto e pare já de reclamar."

"Dê tempo ao tempo e não pense mais nisso" chega para mim como: "Vês quantos lápis de cor tens aqui? Eu sei, estão todos sem ponta e não tens apontador, tampouco uma lâmina, mas podes ver suas cores, olha que vitória! É, teus desenhos continuarão em branco, mas não há o menor sentido em reclamar disso, vai..."

Bem, é assim que eu me sinto. Reconheço as bênçãos da minha vida. Tenho uma saúde excelente, tenho amigos incríveis. Tenho um quarto que posso chamar de meu. Cama, travesseiro, cobertor. Tenho chuveiro quente, excelente comida à mesa todos os dias. Sei conversar, sou educada. Tenho senso de humor, às vezes sou engraçada. Tenho seriedade também e todos os pores do Sol podem ser meus, à beira da praia. Entretanto, falta-me o som harmonioso daquela presença, falta-me o tempero nos meus dias sempre iguais, faltam-me as cores que só podem ser encontradas dentro daqueles olhos que adoro.

"Prestar mais atenção em mim" é um imperativo insosso, tedioso, monocromático. Infelizmente eu me importo demais com esse meu terreno interior, que só floresce com amor. Infelizmente não existe um modus operandi de sentir, embora todo mundo queira me encaixar no seu. Ninguém entende que nasci poeta e que poetas nascem sem o tal botão da razão. Amam minha poesia, mas não entendem o quanto me custa escrevê-las. Infelizmente eu só sei sentir. E eu sinto muito por ser assim.

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