Ainda não são sete horas da manhã

Ainda não são sete horas da manhã. A cada parada, o vagão enche mais. Ele transporta o peso de cada mundo que o adentra. O semblante infeliz é comum a todos nós que, claramente, seguimos à contragosto, com o coração ausente. Ainda não são sete horas da manhã e estamos exaustos. 

A senhora sentada de frente para mim fala ao telefone sobre uma grávida que está prestes a dar à luz. Sua desesperança é cortante.

A outra senhora, no fim do corredor, está numa rede social, vejo pelo reflexo nas lentes de seus óculos. Seu olhar é vazio, espreitar a vida alheia editada a essa hora da manhã é uma gole generoso de veneno.

O senhor ao meu lado vê fotos na tela de seu celular; sua feição exprime saudade.

O rapaz ao fundo, tem os fones nos ouvidos, a cabeça encostada no vidro da janela por onde se veem paisagens tão próximas, tão intocáveis.

No mais vejo todos cabisbaixos, com os olhos em suas telas ou fechados, em negação. 

Temos pela frente apenas uma coleção de horas perdidas, que nos devolverá um pão e encherá de cifras bolsos que não são nossos. Ainda não são sete horas da manhã. O vagão trilha lentamente carregando o peso de cada mundo que nele adentra. As possibilidades vão acontecendo lá fora, mas nunca embarcam nos vagões da rotina sem brilho. Já morremos tantas vezes hoje e ainda nem são sete horas da manhã.


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