Inquietude de domingo à noite





Às vezes revejo minha história com saudade,
como se existisse uma distância
entre quem sou e quem fui

Às vezes custa-me crer no que cri,
no que fiz para ser validada,
no que fiz para ser amada - e não fui,
no que amei para justificar
algum sentido na minha vida

Cada dia que passa
assusta-me mais pensar
naqueles que já se foram
e imaginar que tanta coisa
existiu antes de mim
e prosseguirá, sem a minha respiração

O mar, o céu, a rotina que se impõe...
Sempre estiveram aqui,
independentes dos laços,
independentes de nós

Havendo guerra,
havendo paz ou indiferença,
eles resistiram e seguirão existindo,
ignorando que nascemos
ou que já nos retiramos do palco da vida:
o que mudamos, afinal?

Isso me apequena
e também me consola, cinicamente,
me trazendo na bandeja uma vontade de chorar
porque sei que eu vou passar,
e logo serei uma poeira de vida
nesse repertório de existências

Enlouqueço, então, ao me questionar:
o que estou fazendo para ser lembrada
daqui a milhões de pores do Sol?


.
.
.


Frequentemente me lembro do mundo antigo, onde eu não vivia, mas com que tive contato através das histórias dos mais velhos ou dos registros oficiais.


Você já parou para pensar no que existia antes de você - como a velha organização do dia, do Sol ao nascer, ao se pôr... do mar, indo e vindo, desde a Criação, testemunhando o melhor e o pior de tantas vidas...? - e vai continuar existindo, engolindo sua vida todinha?


Quanto vale ser influente, "influencer"?
Será que somos, de alguma forma, relevantes?


Ainda falamos em Sócrates e Beethoven, Adão e Eva, Thomas Edson e Frida Kahlo... mas o que fazemos para continuarmos vivos daqui a centenas de anos, na saudade e na gratidão de alguém que jamais pôde nos conhecer pessoalmente?